sexta-feira, 12 de junho de 2015

Meu rico Santo António

Este ano não há manjericos
no Santo António,
também não são precisos,
não passam de um mito urbano
que só alimenta quem é pacóvio,
é evidente que eles cheiram a engano,
a trapaça, a ratos perfumados, é óbvio
que o manjerico é um mito
que só deita cheiro durante cinco
minutos e, ainda por cima, não cresce,
ou seja, o manjerico
não presta, não serve,
nem para o pobre, nem para o rico,
nem para quem deve

Mas gosto das quadras escritas
em papel perfumado
que costumam ornar os manjericos
e os seus púcaros de barro:

Durmo na rua ao luar,
não tenho mais património,
dá-me um verdadeiro lar,
ó meu rico Santo António

Enganou-se o poeta,
Santo António só aceita pedidos de casamento,
pedidos da treta,
os pedidos de substância, de dinheiro,
de alimento,
devem ser dirigidos ao ministro da lambreta,
ou ao ministro Coelho, o primeiro,
aquele que se passeia por São Bento

E não me digam que o frade António
também foi aconselhado a emigrar,
não creio,
consultado o histórico,
ficámos a saber que ele foi pregar
para o estrangeiro,
foi fazer para lá o que aprendeu por cá,
apenas isso, nada mais,
e fê-lo tão bem que o fizeram Santo,
se ficasse por cá, não passaria de frade,
ou seria só Fernando,
isto concluo eu, quando já se faz tarde
para ir para a noite de Santo António
comer sardinhas e beber do tintol,
e, se conseguir manter-me sóbrio,
irei declamar estas quadras:

Esta noite em Lisboa
há arquinhos e balões,
sardinhas e pinga boa,
muita gente aos empurrões

Marcha-se na Avenida,
canta-se o fado à toa,
ninguém dorme na caminha
esta noite em Lisboa

Vou subir à Madragoa,
e escorregar na Bica,
vou espalhar brasas e broa
em Alfama e Benfica

Vou bater na Mouraria
e ralhar com o Alto do Pina,
Alcântara já não pia,
nem com a Ajuda da Marina

O Bairro Alto explode
e abraça a vida boa
ele é só para quem pode,
esta noite em Lisboa

Tudo por ti, ó meu Santo,
ó meu rico Santo António,
cobre-nos com o teu manto
e livra-nos do demónio 

Livra-nos também da fome,
da pobreza e do ódio,
vá lá, faz jus ao teu nome,
ó meu rico Santo António