segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Aquela nuvem escura

Aquela nuvem escura
seguiu-me, sempre ameaçadora,
mas em silêncio,
e despejou-me a sua fúria,
assim, de repente,
como uma esponja com o cio,
e apanhou-me de frente,
e vi-me enrolado num rodopio
de vento e de chuva grossa,
bolas de gelo esbranquiçado,
uma terrível escardoça,
um dilúvio de balas de pedraço
que metralhavam a calçada
num ritmado estardalhaço

E o meu caminho
tornou-se numa torrente
de lodo barrento
como um rio revolto,
sem margens, bruto, violento,
"credo, estará o diabo solto?"
gritei eu ao vento

E aquela nuvem escura
não parou de ralhar,
de espirrar, de encharcar,
de estilhaçar, de enxurrar

E depois parou,
nem mais um rugido,
e foi-se embora,
tão naturalmente como chegou,
o céu ficou varrido,
mas o chão não,
era preciso varrê-lo

E a revolta dos elementos
faz-nos sentir minúsculos,
pequenos,
pouco mais do que moluscos
agarrados aos penedos
batidos pelo mar,
e a revolta dos elementos
deixa-nos a gritar,
já chega, já chega, parem,
porque se não pararem
vamos parar ao mar