sábado, 27 de dezembro de 2014

As formigas

Vejo no chão um carreiro, um carreiro bem demarcado,
é um carreiro de formigas pretas, carregadas as que vão
para o formigueiro, leves as que vêm para o mercado
abastecer-se de tudo o que pode servir para o seu pão

São tantas, nunca as contei, é impossível contá-las, são
todas iguais e estão sempre numa correria, num frenesim,
e sempre a trabalhar, e não desertam e não se cansam,
e lá vai parte da seara para a sua toca de ocre carmesim

Parei e agarrei uma das formigas, que ia leve e ligeira,
ela esperneou, cheirou e acalmou, e com voz pousada
disse-me: larga-me ó monstro humano, não valho nada,
sou insecto e não tenho carne, sou uma formiga-obreira

Não como, não descanso, não durmo, ando no carreiro
todo o dia enquanto há calor, grão, palha e folhas frescas
para transportar para o meu clã, para o meu formigueiro,
e se paro sou excluída e entregue às garras das vespas

E não posso fugir, não me cresceram as asas e só sei
andar no carreiro que me marcou a formiga-rainha
a minha rainha a quem obedeço, eu e toda a sua grei,
formigas-obreiras, formigas-soldados, até a joaninha

Por isso, larga-me ó monstro humano cheio de pele
e de pêlos, larga-me, quase morro com o teu cheiro,
e eu larguei a formiga e também tomei o meu carreiro,
afinal, também sou uma formiga, uma formiga com fel