sexta-feira, 11 de julho de 2014

O Alcides

Fui à janela e vi o Alcides,
há muito tempo que não o via,
ainda tem aquela cara de curdo,
o cabelo em espinha
e o bigode farfalhudo,
mas o Alcides está mais velho,
vejo como ele caminha,
a cambalear, a coxear,
e tem o ventre proeminente,
pareceu-me que ia a resmungar,
estará doente?

Ó Alcides, Ó Alcides,
não me ouviu, está surdo,
o Alcides, o curdo,
o herdeiro do Conde de Benevides,
como ele dizia,
quando nos juntávamos à noite já tarde
sob a bandeira da anarquia,
jovens a filosofar
e sem dinheiro para pagar o jantar,
meia dose de bife de sola, o prato do dia

Ouve-me, Alcides, ouve-me, Alcides,
e o Alcides desapareceu da minha vista,
foi-se, seguiu a sua vida,
será que ele ainda é anarquista?
será que ele ainda acredita na revolução?

Merda, o nosso tempo passou
e não fizemos a revolução