sexta-feira, 25 de abril de 2014

A minha alvorada

Há precisamente quarenta anos,
morava em Lisboa, na Avenida João Crisóstomo,
num quarto com vista para o Quartel-General,
cama, mesa e roupa lavada, tudo óptimo,
uma casa de banho para catorze,
onde é que está o mal?

No meu quarto dormiam mais dois,
e mesmo que eu me metesse todo
debaixo dos meus lençóis,
quase não conseguia dormir,
porque um deles passava a noite toda
de luz acesa a ler livros de cowboys
e a roer grossas maçãs de engorda

Na dita madrugada
acordei com a dona da casa a gritar
- eles querem a guerra, mas Deus não a quer -
(era Testemunha de Jeová)
e quando espreitei pela janela do meu quarto
vislumbrei vários carros de combate,
uns de rastos de pneus e outros de lagarta,
e eu, que simpatizava
com a Resistência Popular Anti-Colonial,
pensei logo que a guerra colonial
tinha alastrado à Metrópole
e que ia ser já mobilizado, não para Angola,
mas para atacar o Quartel-General,
e o que se passou a seguir já não é desta história,
porque já é História
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Viva o 25 de Abril