sexta-feira, 9 de maio de 2014

As seis caravelas

As notícias não se calaram,
anteontem atracaram
no Porto de Lisboa
seis caravelas,
ficaram todas juntinhas,
qual delas
a mais bela,
comentavam as varinas

Vinham cheias de gente gira,
de silhuetas espampanantes
e vaidosas,
Lisboa merece uma visita
nem que seja só por três horas,
dizia o seu alcaide

Por isso,
acabou-se a ginjinha no Rossio,
a tasca do Petisco
esgotou o creme de cenouras
e teve que repor as empadas de galinha,
a loja do Evaristo
vendeu todas as vassouras,
a palha de aço e a farinha,
a loja da Tatão
ficou sem os tecidos de seda
e de organdi e não deu vazão
a tanto pedido,
o Grandela
não aguentou a confusão
e teve que encerrar a cancela
antes da hora,
a loja de música da Rua do Carmo
vendeu todos os discos de folclore
e de fado,
o balcão dos pastéis de Belém
rebentou pelas costuras
e nas ruas da Prata, do Ouro e Augusta
não cabia mais ninguém,
mas, pelo que ouço,
ninguém perguntou quanto custa
a nossa prata e o nosso ouro

E ao cair do dia
foram-se embora as caravelas
e a sua gente gira,
Lisboa ficou a vê-las
a descer o Tejo,
e ficou mais triste o entardecer
porque se foram embora as caravelas

E fizeram-se as contas
e as notícias disseram depois
que a gente gira
não era assim tão rica,
não gastaram milhões,
como estava previsto,
mas só quinhentos,
paciência, digo eu,
somos mesmo maus
a fazer orçamentos