terça-feira, 20 de maio de 2014

Hoje é dia de irem à feira de São Mamede

Hoje é dia de irem à feira,
à feira dos vinte,
tragam-me de lá uma seira,
ou uma cesta de vime,
com muita abundância
de doces e de mimos
e de outros carinhos
que se dão a uma criança

Não me digam que não têm dinheiro
para gastar na feira,
porque não vendem o gado,
porque não vendem a jeira,
falta-me agasalho,
os meus sapatos quase não têm sola,
não quero parecer um espantalho,
não quero ir para a escola
assim, quase descalço

Hoje é dia de irem à feira
e se não tiverem dinheiro
para irem na carreira,
vão a cavalo no burro,
ele conhece o carreiro
que vai direito à feira
e ele não é casmurro

Hoje eles não foram à feira,
à feira dos vinte,
disseram-me que iam à seguinte,
à feira dos quatro,
e ninguém tem dó de mim,
um pobre coitado,
porque eles não foram à feira dos vinte
e também não foram à seguinte,
à feira dos quatro,
e à seguinte, e à seguinte ...

E ninguém tinha dó de mim
naqueles dias de ir à feira
quando eu era criança,
porque esses dias eram para mim
a ilusão da abastança,
o desejo de nada me faltar,
e a chama da esperança
de poder um dia comprar
tudo o que eu quisesse
na feira de São Mamede,
a feira dos vinte, ou a feira dos quatro